quarta-feira, 31 de dezembro de 2008

Poesia no café

Vou comer poesia no café da manhã,
degustar em cada verso o sabor das imagens.
Depois nem vou escovar os dentes
Só para ficar o gostinho, por mais tempo, na boca.

terça-feira, 30 de dezembro de 2008

Página (quase) em branco

As vezes os poemas são curtos
Só para economizar espaço na folha.
Outras vezes, para ocupar mais espaço na mente de quem lê.

Retratos e porta retratos:

Amigos retangulares,
Sorriem,
Alheios ao tempo,
Que teima em pintar de amarelo
todos aqueles sorrisos.

segunda-feira, 29 de dezembro de 2008

Dobras no papel

Como a criança cria em tudo,
Criava tudo na imaginação,
Dobrava o papel, fazia um barco,
Com outro papel, eis um avião...

Não pensava em conhecer novos mares,
Nem queria alcançar novos céus,
Dobrava, dobrava, dobrava, dobrava...
Despretensiosos sonhos de papel.

Verso e Prosa

O Verso brigou com a Prosa e a briga foi acirrada, o Verso ficou sem rima e a Prosa, antes, tão falante, se tornou meio calada.
Até que, certo dia, o Verso adoeceu, alguma coisa crônica, não sei bem o que.
A Prosa compadecida foi visitá-lo. O Verso, de tanta surpresa, teve um desmaio.
Por arrependimento ou talvez por remorso (quem saberá?), a Prosa pôs-se a chorar. E ainda chorava quando o verso abriu lentamente seus olhos com um leve sorriso no canto da boca.

domingo, 28 de dezembro de 2008

Coleção de sons

Arrumo minha coleção de sons
(faz tempo que não arrumava)
Deixei que o barulho das máquinas
Me tirasse o prazer de ouvi – los.

Guardo sons diversos:
Sons de criança brincando,
Correndo, pulando...
Subindo na goiabeira, caindo...
Indo pra cachoeira, rindo, rindo...
Mergulho da ponte,
Era a fonte da juventude e eu nem sabia!

Engrenagem de bicicleta,
Chão de barro,
Quedas e mais quedas.
Futebol no campinho,
Rodar pneu, caçar passarinho...

Arrumo minha coleção de sons,
A me deliciar com cada um deles.

Como folha no vento...

A Vida é como uma folha no vento esperando o momento de cair...
Madrugada, no Rio de Janeiro, trabalham intensamente as impressoras de um conhecido jornal. Caminhões e mais caminhões saem em intenso frenesi, para que o noticiário chegue às mãos ávidas de seus leitores.
Inúmeras notícias estampam as páginas diariamente, hoje, assim como em todos os dias, em meio a tantas outras noticias mais importantes, há uma pequena nota no canto de uma das páginas internas, sem nenhum destaque: “Jovem empresário se envolve em acidente de trânsito, atropela pedestre e bate em árvore e os dois morrem em pleno centro da cidade.”
Duas vidas ceifadas num instante, duas vidas resumidas numa pequena nota de jornal.
Pedro saiu apressado de sua pequena casa na favela, não estava atrasado, mas a ansiedade já era um hábito. No mesmo instante Lucas acorda em seu apartamento bem decorado de frente para a praia de Ipanema. Para Pedro não houve tempo para o café, enquanto que Lucas preferia tomar o café no escritório, coisas de um workaholic solitário.
Lucas tomou a direção do seu carro importado “do último tipo”, como diria meu velho pai, e atravessou a rua sem maiores problemas, o trânsito naquele dia parecia surpreendentemente calmo. Pedro pegou o ônibus em direção ao Centro da cidade, lotado, como de costume.
Apesar do aperto no ônibus , Pedro ficou pensando no final de semana que passou com a família na ilha de Paquetá, passeio simples e barato mas que lhe fazia muito gosto, afinal de contas só de ficar em um local onde não havia barulho de carros já era uma coisa e tanto.
Lucas ,enquanto dirigia, lembrava dos dias em Angra dos Reis, balneário luxuoso, que costumava ir quase todos os fins de semana com os amigos.
Pedro desce do ônibus com certa dificuldade, mas dá um suspiro de alívio. Lucas aumenta o volume do rádio.
Pedro atravessa a rua, último limite para chegar no trabalho. Ainda no meio da rua, sem perceber um carro vem em sua direção, é o carro de Lucas que num relance de distração está cara a cara com o um pedestre desconhecido, os olhares de desespero se cruzam, motorista e pedestre, neste instante os dois são um só.
Num gesto instintivo Lucas faz uma manobra e joga o carro um pouco para a esquerda ao mesmo tempo em que Pedro, também por instinto, joga o corpo para trás e por um fio o carro e o corpo não se esbarram num acidente fatal.
Ambos prosseguem suas jornadas e suas vidas, tendo apenas este momento em comum. Não houve culpados, ambos sabem disto, mas aquela troca de olhares vai ficar na memória dos dois pra vida inteira.
Pedro completa a travessia da rua, passa na banca e compra o jornal, nem deu bola para a noticia do acidente fatal que havia acontecido naquele mesmo lugar, naquela mesma hora do dia anterior, afinal era apenas uma notinha sem muita importância.
...Naquele momento, as folhas no vento foram sopradas por uma brisa suave e continuaram a planar. Não se sabe por qual capricho do destino, nem por quanto tempo.

sábado, 27 de dezembro de 2008

Fazenda High Tech

Hoje estou visitando, não sei se meio acordado ou meio dormindo, uma fazenda bem diferente, digna destes tempos de internet, fast food e individualismo.
A fazenda possui câmeras espalhadas por todos cantos, que transmitem em tempo real o reality show da vida rural, desde o namoro no galinheiro até a preparação da saparia para o show noturno.
A fazenda é reconhecida mundialmente por sua notável produção de leite de soja, possui um enorme rebanho onde cada soja é ordenhada diariamente por métodos modernos e higiênicos. E para o bem estar das sojas leiteiras tudo é feito ao som de Roberto Carlos : “Quando eu estou aqui eu vivo esse momento lindo!...”, a cada acorde da canção do Rei , sem nenhuma explicação cientifica, as sojas aumentam a produção do precioso leite que vertem dos seus úberes.
Outro ponto importante da fazenda é a vinícula. Uma grande plantação de vinas, ou salsichas, se preferir, pois suas safras de cachorros-quentes são premiadas internacionalmente e encantam os refinados gostos da elite mundial, afinal de contas é uma salsicha tão especial que só produz uma vina por cacho.
A horticultura ou produção de saladas é outro setor da fazenda, ao invés de produzir hortaliças individualmente, cada planta produz a salada completa e temperada. Tem por exemplo a planta de Ceasar salad que possui folhas de alface romana, brotos de queijo parmesão ralado, flores de mini pães temperados e etc... e são colhidas já com o molho especial.
Bem, há muitas outras coisas interessantes que não poderia contar-lhes nestas poucas linhas, escritas enquanto visito a fazenda acompanhando minha esposa, como já citei, não sei se meio acordado ou meio dormindo.
Ah! Já ia esquecendo! O nome da fazenda é Wal mart.
Vou parar por aqui pois o sinal sonoro do caixa-rápido já apitou duas vezes e vou ter que pagar a visita na saída. Até a próxima!

sexta-feira, 26 de dezembro de 2008

Alumbramento

Da janela do avião,
Com alumbramento observo
as luzes que brilham lá embaixo.

Depois com os pés no chão,
as mesmas luzes acesas
me parecem simplesmente luzes acesas.

Será que à distância tudo se torna mais belo?
Ou a proximidade que nos faz perder o encantamento?

Liquidificador

Sou um grande liquidificador
Misturo a dor ao prazer,
A alegria à tristeza,
Uso a poesia do concreto duro das ruas
E a pureza da fumaça das fábricas,
Um pouco do céu de dias nublados
E da chuva do fim de tarde,
Pego minha própria humanidade
Sua enfermidade e beleza,
Junto tudo ...
Coloco um pouco de açúcar
Liquidifico, liquidifico, liquidifico...
E bebo esta mistura homogênea que se chama vida.

quinta-feira, 25 de dezembro de 2008

Cada palavra merece o seu momento

Cada palavra merece o seu momento,
Cada momento também merece a sua palavra
E neste jogo de quem merece quem nasce a poesia.

Palavreiro

Palavras são setas
Que injetam veneno na veia.
São metas,
São retas perpendiculares.

São portas abertas
Para quem quiser entrar,
São grandes janelas
Que nos permitem ver a rua.

São imensas tetas
De leite e deleite,
De litros de letras.

Transe com as palavras,
Entre em transe com elas,
Trance com as palavras,
Transite por meio delas

Pegue com a mão cada uma ,
Tome na mão todas elas,
Triture,
Misture,
Transforme...

Até que delas ( e de você! )
Não se encontre mais nada,
Até que nelas ( e em você! )
Encontremos tudo.

quarta-feira, 24 de dezembro de 2008

Fraqueza do macho

“Se tenho que me gloriar, me gloriarei em minha fraqueza.” (2 Cor. 11:30)


Não busco palavras,
Construções perfeitas
Ou sintaxes irrepreensíveis.
Procuro sentimentos.
Sentimentos presentes no meu dia-a-dia
E ocultados pela auto-preservação.

Quero expor as mazelas da minha alma,
Trazer à luz as fraquezas encobertas
E a pobreza do meu coração.

Tenho medo, angústia, tristeza...
Sou inseguro e tenho falta de fé.

Sou fraco em coisas que às vezes
Pareço uma rocha.
Sou forte quando não deveria ser
E por isso sou independente.

Atitudes me faltam
Quando deveria agir,
Ações me atropelam
Quando deveria apenas ouvir.

Tenho necessidade de reconhecimento
E não sei lidar com ele,
Um elogio me desmonta
Tanto quanto não ser elogiado.

Sinto carência de afeto
E medo em demonstrá-lo
As pessoas me assustam,
O contato próximo me apavora.
É difícil abrir meu coração
Expor opiniões é bem mais fácil
Do que expor a si mesmo !

“Miserável homem que sou!
quem me livrará o corpo desta morte ?”

Vou em frente, luto contra mim mesmo
Com socos, tapas e pontapés
Esmurro o homem interior
Até que ele, sem forças para reagir,
Manifeste a verdadeira força que há na fraqueza

E assim sigo a rascunhar os dias,
Por vezes tateando o Infinito efêmero,
Encharcado de humanidade.
Related Posts Plugin for WordPress, Blogger...